Os pais de Dr.
Laerte, um jovem médico são convidados para uma viagem ao Rio de Janeiro, para
um batizado de um sobrinho. Havia mais de vinte anos que não iam ao Rio.
Como não queria deixar a casa sózinha com as empregadas, foi ao sítio e
trouxe um empregado chamado Galdino, um rapaz com um olho infeccionado,
tracoma, para cuidar da casa nos quinze dias que ficaria fora. O tal empregado,o Galdino, estava morto. As
empregadas se desesperaram, mas não havia nada a fazer, ele havia tido outro
ataque e caiu da cama e morreu. Aí começam os problemas, o dono da casa longe
em viagem, cabe a mim tomar as providências. Fui atrás do médico que atendeu-o
na noite anterior, para que desse o atestado de óbito, e ele se recusa, dizendo
que o corpo precisa ser recolhido para uma autópsia. Para isso, foi preciso ir
a uma delegacia para pedir uma guia. Quando parece que tudo está certo, o
médico não quer fazer a autópsia, pois o corpo apresenta algumas manchas. Por
fim depois de muitas contovérsias, indas e vindas com o corpo pra cima e pra
baixo, ele consegue enterrá-lo, sózinho sem nenhum parente, pois o paradeiro
destes era desconhecido. Quando seu pai volta fica muito triste com a notícia,
e numa conversa com o filho, lhe conta a história do pobre Galdino. Filho de
uma mulher que trabalhou de sua empregada
anos atrás.E para sua surpresa descobre que este pobre empregado que
morreu sózinho e foi enterrado quase como um indigente, muito provavelmente era
seu irmão.
O filho era médico, mas tinha sua família e
não poderia cuidar da casa do pai. Foram pai e filho buscar o Galdino, no
sítio, que por sinal estava bem cuidado. E veio o empregado com pai e filho.
Quando chegou, o patrão mostrou seus aposentos e logo foi mostrando o
que teria de fazer na sua ausência. Varrer o quintal, cuidar das flores, aguar
as plantas e coisas do tipo, todoas as recomendações foram feitas. e assim no
fim do dia partiram para o Rio de Janeiro.
Na manhã seguinte fiz minhas visitas normais de médico, e quando chego
ao consultório, a secretária me relata que a empregada da casa de meu pai está
desesperada atrás de mim. Liguei pra ela, e ela me disse que tiveram que chamar
o pronto socorro pro Galdino, pois tivera um ataque epilético. Mas agora estava
medicado e dormindo. Fui lá pra ver. Quando chego lá qual não foi a minha
surpresa, descobre que este pobre
empregado que morreu sózinho e foi enterrado quase como um indigente, muito
provavelmente era seu irmão. marilise3673.blogspot
Para tomar conta da
casa durante sua viagem, o pai faz questão de trazer um humilde empregado de
seu sítio. O filho não gosta da idéia e, aliás, acha o tal do empregado muito
esquisito. Mas isso é apenas o começo de um sinistro pesadelo. Mal o pai parte,
o empregado morre misteriosamente.
E enterrar os restos
mortais se revela mais difícil do que qualquer um pode imaginar. Em Os Restos
Mortais, Fernando Sabino consegue unir mistério, humor, emoção e lirismo, numa
narrativa envolvente pela simplicidade da linguagem e pela força dramática de
um desfecho surpreendente.
Minha opnião: Esse
livro é tão interessante, ver o desenrolar da história, dá um nervoso quando
sente-se os problemas que o personagem passa. É realmente incrível. Só posso
dizer que depois dos fatos, um tanto engraçados, o livro traz uma lição que não
se esquece.
Bom, eu achei esse pequeno livro na biblioteca da minha escola, e com
meu olhar preguiçoso: ele tem apenas 62 páginas! Pois é, fikdik para as
"sem tempo" como eu. Mas confesso, depois desse, não vou largar os
livros nunca mais! ( Suzana Coral )
O medo é uma
realidade que nos atinge a todos: impossível pensar em alguém que nunca
tenha experimentado
“na pele” esse sentimento. E como a literatura é produção humana, impossível também não
percebermos a presença do “tão humano” medo em muitas obras literárias. A arte
tem a capacidade de agir sobre nossas emoções e sobre nosso corpo – parafraseando Edgard
Alan Poe, a obra de arte é um grande artefato capaz de produzir emoções diversas
em nosso ser.
É o caso de Os restos
mortais, de Fernando Sabino. Nessa obra, um narrador em primeira
pessoa conta as
peripécias pelas quais passou logo após a viagem de seu pai ao Rio de Janeiro.
A narrativa se passa no ano de 1963, em Belo Horizonte. Dr. Laerte, médico
renomado, se vê em uma horripilante situação. Para tomar conta da casa durante
uma viagem, o pai do médico faz
questão de trazer um
humilde empregado de seu sítio em Betim. O empregado, de nome Galdino,
possuía muitos
elementos físicos que causavam em Laerte. Ele o descrevia como “um rapaz com
olho infeccionado,
tracoma (...). Podia ter seus trinta anos, embora corpo franzino e a roupa velha
de cor indefinível
lhe dessem aquele ar de bicho sem idade que a pobreza costuma ter” (SABINO, 2005:11-2).
Embora contrariado, o
filho acata a idéia do pai. Contudo, mal o pai parte em viagem, o
empregado tem um
ataque epiléptico de madrugada. Vai ao médico, é receitado e volta para a
casa de seu patrão.
Contudo, no dia seguinte, as empregadas ligam desesperadas para Dr. Laerte,
informando-lhe sobre
a trágica ocorrência: o empregado Galdino estava morto; morrera de
madrugada. Isso é
apenas o início de um sinistro pesadelo...
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O conto tem início
com a presença do narrador em primeira pessoa, isto é, o próprio Dr.
Laerte, apresentando
ao leitor a inquietação de seu pai em ter que viajar ao Rio de Janeiro com
sua mãe. A princípio,
percebemos que alguma coisa incomum pode acontecer... Fernando Sabino, a meu ver, ao
apresentar esses elementos psicológicos dos personagens logo no início da
trama,
quer preparar o
leitor para os fatos trágicos que irão surgir – “o terror é induzido pela
surpresa; o
suspense, pelo aviso
prévio” (HITCHCOCK, 1998). O autor quer preparar o coração do leitor! Desde
o princípio
experimentamos uma sensação de insegurança, o que, na perspectiva de H. P.
LOVECRAFT (2007), é o
elemento central e primordial de uma trama de horror: o critério final de
autenticidade de uma
obra de horror não é o enredo, mas o tipo de sensação que ela é capaz de
produzir. Essa
angústia inicial se dá justamente por não conseguirmos, de imediato, objetivar
o
medo, ocorrendo,
assim, um mal estar.
A trama se passa em
situações normais da vida. Não há nada de novo, tudo ocorre
tranquilamente, como
em um dia qualquer. As pessoas são as mesmas, o dia transcorre do mesmo
modo. Até que uma
situação “anormal” suscita uma transformação na normalidade da vida: com a
morte do empregado
Galdino as coisas mudam de cor, o ar ganha um peso enorme, o que era
belo torna-se
horrível. O medo surgido pelo fato da morte tira a razoabilidade das coisas, da
existência, como diz
Montaigne (1991).
Também logo no início
percebemos essa mesma angústia quando Dr. Laerte e seu pai vão
ao sítio buscar
Galdino. Isso ocorre pela imprevisibilidade do outro. Onde há falta de controle
das
ações alheias surge o
medo. Aqui, nós, leitores, começamos a sentir certo temor pelo que pode
estar por detrás da
situação apresentada.
Muitas dificuldades
surgem quando o empregado da família morre e Laerte encontra
dificuldades em
enterrar os “restos mortais” de Galdino: problemas com os médicos legistas, com
a polícia e,
principalmente, com seu próprio pai. O enterro sempre adiado acaba por
construir um
sinistro tormento, um
clima de pesadelo. Muitas são as cenas que apresentam um clima de medo,
de angústia e de
ansiedade. A trama nos manipula do início ao fim – o desejo de compreender é o
que nos mantém atentos
às dúvidas suscitadas pela narrativa. E a curiosidade diante do
desconhecido nos leva
à experiência do medo estético. Como nos diz Lovecraft (2007:13): “a
emoção mais antiga e
mais forte da humanidade é o medo, e o tipo de medo mais antigo e mais
poderoso é o medo do
desconhecido”.
* * *
O clima lúgubre da
novela de Sabino remete ao ambiente das narrativas góticas. De modo
geral, podemos
observar que a literatura de horror se alimenta das nuanças góticas, tais como
cenas sombrias,
castelos antigos horripilantes etc. Na verdade o homem como um todo vive,
muitas vezes, em
profundo clima natural de medo e horror. O gótico, enquanto estilo literário,
veio simplesmente
cristalizar uma realidade já experimentada por todos os homens, de todos os
tempos e lugares. É
como se o gótico não fosse propriamente um estilo, mas sim um estado de
espírito do homem
ante a realidade desconhecida de todos. O próprio cenário da casa muda por
completo no conto,
com a presença do cadáver de Galdino – “tudo no quarto ganhara aquela
inconfundível
atmosfera de irrealidade que denuncia a existência de um cadáver – o silêncio,
a
imobilidade das
coisas ao redor, o tempo parado” (SABINO, 1995:16).
Sabemos que o
desconhecido é o elemento principal nas narrativas do medo. E o
desconhecido se faz
presente na obra desde o início: ninguém conhece Galdino; ninguém sabe de
onde ele veio;
ninguém sabe a causa mortis do empregado; muitos problemas surgem para o
enterro etc.
Um elemento
importante na trama para nossa percepção do medo é o próprio caminhar
dos personagens na
história. Eles são indicadores de que o horror se faz presente. Com eles nós
nos assustamos, temos
medo e sentimos isso “na pele” – “as reações emocionais dos personagens
fornecem, pois, uma
série de instruções, ou melhor, de exemplos sobre a maneira como o público
deve responder aos
monstros da ficção – ou seja, sobre a maneira como devemos reagir a suas
propriedades
monstruosas” (CARROLL, 1999:26). Os personagens da trama nos levam a
experimentar o medo,
partindo de seus próprios medos. Por exemplo, as empregadas se assustam
ao ver o cadáver de
Galdino no chão do quarto; o Dr. Laerte se assusta ao perceber que o corpo de
Galdino, que estava
no chão em determinada posição, se encontra em outro instante em posição
diferente.
No fim, acontece uma
grande mudança no enredo: a tranquilidade se instaura no conto,
quando o corpo de
Galdino é enterrado. O cadáver era o elemento instaurador do medo e da
angústia na obra. O
pai de Laerte retorna e, em conversa com seu filho, deixa transparecer que
Galdino era seu
filho, irmão de Laerte. O clima de medo some, dando lugar a outras sensações.
Há
uma peripécia na
trama de Sabino, fazendo com que tudo retorne a ser como antes. A paz se
instaura novamente na
história.
* * *
Os restos mortais é,
pois, um bom exemplo de como elementos “góticos” se fazem
presentes em obras
literárias que têm o medo como elemento de sua estrutura. Assim, o “gótico”,
menos que um estilo
artístico, seria o sentimento de morbidez, tristeza e apatia que suscitaria o
medo propriamente
dito. O gótico literário surgiu como uma resposta ao Racionalismo que
cerceava a utilização
do sobrenatural na literatura. Contudo, o gótico não foi propriamente uma
criação original
artística, mas a institucionalização, na arte, do “clima” de terror e medo já existentes no próprio
coração humano, uma representação artística de uma tendência natural humana.
O gótico literário é
a expressão estética do que há mais profundo no coração humano no
que diz respeito ao
medo. É uma manifestação de uma faceta do ser humano e não pura criação
artística vinculada a
um dado momento histórico europeu. Assim, o “gótico” existe bem antes do
próprio gótico;
existe desde o momento que o homem percebeu que as realidades não conhecidas
eram fontes
constantes de admiração, estranhamento e medo.
( Alan Soares Delgado )
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